Publicado por: Marcos Damigo | 22/05/2012

Coleções em Campo

Novos espaços

Assistir ao novo espetáculo da Intrépida Trupe, concebido por Valéria Martins, nos propõe uma questão antes mesmo de começar. Encenado gratuitamente de quinta a domingo às 15 horas no Campo de Santana, no Centro do Rio de Janeiro, existe já de cara o convite a passar algumas horas num lugar que, apesar de sua beleza e importância, é bastante ignorado por quem não circula muito por aquela área da cidade.

Vale um parênteses então: o Campo de Santana é um oásis em meio à loucura da região, com baobás e ficus gigantescos, espelhos d’água, cotias e pavões, que dividem o espaço com uma infinidade de gatos, abandonados ali por seus ingratos ex-donos. Para se ter uma dimensão da sua importância, naquele exato local foram feitas as aclamações de D. João VI e D. Pedro I como Imperadores do Brasil.

A proposta da Intrépida de ocupar aquele espaço adquire então desdobramentos que vão além do próprio espetáculo, e que nos fazem refletir sobre a maneira de nos relacionarmos com essa cidade bela e cruel que é o Rio de Janeiro.

Iniciativa similar foi feita em 2011 no Tempo_Festival, onde o espetáculo “Sua Incelença Ricardo III”, da Companhia Clowns de Shakespeare, de Natal, dirigida por Gabriel Vilela, foi encenado ao lado da estação de teleférico então recém-construída no Complexo do Alemão, como parte das obras do PAC na cidade. Quem esteve ali presenciou um momento raro na história da cidade.

Não há como falar de Coleções em Campo, portanto, sem mencionar os raios de sol atravessando a folhagem, as pessoas sentadas na grama, as cotias correndo em volta, as revoadas de pombos em momentos quase ensaiados, e as crianças que pareciam responder com seus corpos soltinhos às movimentações dos intérpretes.

O atual espetáculo é o desdobramento de um primeiro trabalho, chamado apenas “Coleções”, que estreou em 2009 no Palácio Capanema, sede do Ministério da Cultura no Rio de Janeiro. Em ambos, uma proposta arrojada de diluir categorias, colocando os intérpretes em relação com obras de artistas plásticos, em espaços não convencionais.

Neste segundo, são utilizadas obras de Raul Mourão, José Spaniol e Cláudia Hersz, e uma instalação sonora de Daniel Castanheira, que esconde caixas acústicas pelas copas das árvores, criando uma ambientação sonora que se harmoniza com o próprio espaço.

A pesquisa dos intérpretes parece buscar um diálogo com os objetos criados pelos artistas plásticos, tanto no sentido da exploração das formas, quanto de suas potencialidades como suporte ao movimento dos corpos. Nesse sentido, o trabalho de José Spaniol chamado “descanso da sala” ganha naturalmente algum destaque por oferecer mais possibilidades neste jogo. A obra nos remete realmente a uma sala desproporcional, mas seus elementos estão refletidos de forma invertida na parte de cima, oferecendo ao espetáculo uma brincadeira onde se confunde nossa ideia tradicional de um mundo organizado em “cima” e “baixo”.

Raul Mourão ofereceu uma obra chamada “balanço maré 3 (para bela e lia)”, onde canos metálicos formam uma estrutura que oscila em torno de um eixo central, oferecendo nesse seu movimento o suporte para os corpos que fluem pendurados.

Cláudia Hersz traz uma grande girafa vermelha desmontada em três partes, chamada “toys é nóis”, remetendo ao universo dos brinquedos infantis, onde os intérpretes exploram um paralelismo entre seus próprios corpos e as partes da obra.

Os figurinos coloridos de Gabriela Campos emprestam um caráter lúdico ao todo. Isso, aliado à dimensão das três obras, remete o todo ao universo das fábulas, de estranhas e simpáticas criaturas habitando um mundo poeticamente transformado.

O projeto prevê também a realização de oficinas gratuitas no próprio Campo de Santana. Informações abaixo.

 

Serviço:

Coleções em Campo
Campo de Santana – Centro / RJ

ENTRADA FRANCA

Quinta a domingo às 15h até 03 de junho

OFICINAS GRATUITAS: As oficinas combinarão técnicas de movimentos com a experiência artística que resultou no espetáculo “Coleções em Campo”. O aluno será convidado a mover o corpo de forma criativa interagindo com objetos de arte dispostos no próprio Campo de Santana. Na prática, serão utilizadas técnicas de dança, acrobacia e teatro. As aulas terão duração de duas horas, e serão oferecidas ao público em geral a partir dos 8 anos. A trupe recomenda roupas flexíveis que facilitem os movimentos.

HORÁRIOS DAS OFICINAS: 2ª, 3ª e 4ª: das 10h às 12h e das 14h às 16h / 5ª e 6ª: das 10h às 12h.

FICHA TÉCNICA

COORDENAÇÃO GERAL, CONCEPÇÃO E DIREÇÃO: Valéria Martins
ARTISTAS VISUAIS: Cláudia Hersz, José Spaniol e Raul Mourão
DIREÇÃO DE MOVIMENTO: Flávia Costa e Guilherme Lazari
ELENCO: Fabiano Nunes, Flávia Costa, Guilherme Lazari, Luar Maria, Pedro Coelho e Tatiana Miranda
FIGURINOS: Gabriela Campos
INSTALAÇÃO SONORA E TRILHA ORIGINALMENTE COMPOSTA: Daniel Castanheira
DESIGN GRÁFICO: Corja Lab – Bruno Senise e Felipe Norkus
PRODUÇÃO EXECUTIVA: Cida de Souza e BlocoPi Produções
ASSESSORIA DE IMPRENSA: JSPontes Comunicação – João Pontes e Stella Stephany


Respostas

  1. Não sabia que o nome do lugar era Campo de Santana,
    mas sempre me intrigou (encantou, atraiu, me deixou curiosa)
    este espaço que reconheço não pela imagem de seu interior,
    mas por sabê-lo através das grades (com seus gatos, cotias, sombras e luzes), de tanto vê-lo passando pela janela do ônibus,
    como numa tela de cinema.

  2. pois então, uma boa oportunidade pra entrar nele!


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